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 Artigo de Opinião

Somos a soma de todas as partes.

Quando em 1996 saí de uma instituição de reabilitação onde trabalhei desde 1988 e vim para a educação especial para a escola pública, apoios educativos na altura, deparei-me com a solidão do professor de educação especial.

De facto, trabalhara durante anos com uma equipa multidisciplinar, onde a intervenção com cada aluno era delineada por todos os intervenientes no seu processo de desenvolvimento.

Na escola pública, a realidade era bem diferente. Faltavam-me os terapeutas, os psicólogos, os médicos, faltavam-me as reflexões, o olhar de cada um para a decisão conjunta. Contactava com os serviços clínicos de cada aluno, mas não éramos uma equipa.

Se andei vinte cinco anos para trás, foi porque os primeiros oito anos da minha atividade profissional foram determinantes para que percebesse a importância; o valor; a necessidade de uma equipa multidisciplinar na avaliação, na tomada de decisão das estratégias e na intervenção com crianças e jovens com necessidades educativas.

A criação dos Centros de Recursos para a Inclusão (CRI), com a aprovação do Decreto-lei 3/2008, constituiu uma mais-valia para a intervenção com os alunos, vindo enriquecer as equipas e a qualidade do trabalho, sendo assim possível disponibilizar, em contexto de escola pública, um vasto leque de áreas que até então estavam deficitárias.

A minha experiência de trabalho nesta parceria com o CRI, começou numa Unidade de Apoio a Alunos Multideficientes (UAAM). O desenvolvimento infantil não é estanque e essencialmente neste contexto necessita mais do que nunca de uma intervenção multidisciplinar. O trabalho em equipa surgiu desde logo, de forma muito natural, como se não houvesse outra forma de ser feito. A terapia da fala era feita em contexto de sala de Unidade, onde a comunicação aumentativa e o treino de alimentação eram continuados quer na escola pelos professores e assistentes operacionais, quer em casa pelos seus cuidadores, todos os dias da semana, pois são necessidades constantes na vida de uma criança, não se compadecendo só com a intervenção de 2 sessões semanais. O mesmo acontecia com a terapia ocupacional. Se uma criança necessitava de estar posicionada num standing frame, era feito com o seu terapeuta em contexto de sala de aula, por exemplo. O mesmo se aplicava a outras áreas, sem prejuízo de uma intervenção individual.

Extrapolando este princípio para outros graus de ensino e outro tipo de necessidades educativas, a equipa do CRI começou logo por reunir com o departamento de educação especial, bem como marcar presença nas reuniões de conselho de docentes do primeiro ciclo e conselhos de turma do segundo, terceiro ciclos e secundário. Esta foi uma parceria iniciada no antigo Agrupamento de Escolas João de Deus, agora Agrupamento de Escolas Ibn Mucana. A sua presença nas reuniões com encarregados de educação, dos alunos que beneficiavam de terapias passou a ser uma constante. Éramos uma equipa.

A referência ao passado ajuda-nos a entender o presente. E este é o presente, a equipa do CRI faz parte de nós, do nosso agrupamento. Somos uma equipa. Este é o nosso modelo de funcionamento. É comum um qualquer professor perguntar pelo horário da psicóloga, do terapeuta ocupacional, da terapeuta da fala. A sua presença, a sua necessidade, a sua importância são reconhecidas. Quando é necessário também há o trabalho com as turmas dos alunos com necessidades educativas. Muitas vezes eles precisam de entender o que se passa com aquele colega, precisam de estratégias para saber lidar com determinadas situações e os técnicos do CRI lá estão. Quando é possível, articulamos com o Serviço de Psicologia e Orientação (SPO) da escola, com a Saúde Escolar, ou outros serviços de saúde.

Esta interação, este estar dentro da dinâmica do agrupamento, da escola, da sala de aula, também fornece recursos importantes aos técnicos para uma intervenção mais eficaz e mais consciente.

As tomadas de decisão são participadas e as reuniões com os encarregados de educação são em conjunto. Se considerarmos que em algum momento pode haver lugar a decisões individuais, elas acontecem. Completamo-nos.

Nem sempre estamos no caminho certo, mas procuramos juntos encontrá-lo.

Descobrimos em conjunto que desta forma maximizamos as nossas sinergias em prol do desenvolvimento dos nossos alunos.

Ao fim de 30 anos de serviço, o trabalho em equipa, além de uma necessidade, é uma convicção inabalável.
Somos a soma de todas as partes.

Isabel Correia,
Professora de Educação Especial
Grupo de recrutamento 910
Agrupamento de Escolas Ibn Mucana