Artigo de Opinião
ESTE É O MOMENTO.
Por estes dias estamos todos agastados com a crise sanitária que sobre nós se abateu, a qual gerou uma crise económica e social também repentina e de graves consequências humanitárias. Se a curva de infetados continua em sentido ascendente, gerando a necessidade de alocação de mais recursos à área da saúde, não é menos preocupante a ascensão da curva dos que necessitam de apoio económico e de acompanhamento nas suas necessidades básicas.
As instituições do Terceiro Setor não têm mãos a medir, estando elas próprias em risco de rutura da sua capacidade de resposta, ao qual se junta um temor diário de decréscimo de apoios.
Estaremos a entrar na “tempestade perfeita”. Com o Estado, empresas e famílias endividados acima do aconselhável, uma economia que gera baixos rendimentos e uma forte dependência externa, mesmo que desejemos o melhor, o pior pode acontecer e é para este cenário que devemos trabalhar nas ações a tomar.
De acordo com o último relatório da Conta Satélite da Economia Social portuguesa, resultado de uma parceria entre o INE e a Cooperativa António Sérgio para a Economia Social, o Terceiro Setor português conta com mais de 70 mil instituições com fins altruístas, nos mais variados setores de atuação (serviços sociais, educação, saúde, cultura, entre outros). Este setor privado social representa 3% do valor da nossa economia e emprega mais de trezentas mil pessoas (a que acrescem milhares de voluntários). É fácil concluir que se trata, portanto, de uma peça fundamental e incontornável na resposta às necessidades sociais dos portugueses, ao qual o Estado não teria capacidade de se substituir (nem se deve pretender que assim seja) num curto espaço de tempo.
É neste contexto que precisamos do nosso Terceiro Setor mais forte do que nunca. As instituições de solidariedade social devem concentrar-se no seu papel de resposta ao acréscimo de solicitações e não no temor de estrangulamento financeiro e diminuição de bens doados. Isto quando se calcula que o Terceiro Setor tem, em anos ditos “normais”, um deficit anual superior a 600 milhões de Euros, ou seja, para que funcione normalmente e cumpra o seu papel, necessita de ser financiado pelos outros agentes económicos (Estado, empresas e famílias).
Se na relação com o Estado existe uma base de apoio estável (vem de 2011 o primeiro protocolo bienal de Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário, celebrado entre o Estado e os representantes do Terceiro Setor, estando em vigor o Compromisso para 2019-2020), o mesmo não se pode dizer na relação com as empresas. Aqui domina a consciência dos acionistas, naquilo a que chamamos responsabilidade social das empresas.
É evidente que a primeira missão das empresas neste momento é a sua própria sobrevivência e a preservação dos postos de trabalho que garantem, mas não podem esquecer o apoio ao Terceiro Setor, que luta de perto contra as situações mais extremas.
Na Deloitte queremos ser um exemplo e manter o apoio ao Terceiro Setor nestes dias de maior dificuldade. Este apoio pode realizar-se de diversas formas, seja por financiamento direto das suas atividades, seja através da aquisição de bens e serviços prestados pelas entidades que o compõem. Gostamos particularmente de instituições que buscam a sua sustentabilidade económica de forma proactiva, como é o caso da CERCICA, cujo fantástico trabalho conheci há quase dois anos. Não hesitámos, por isso, em incluir em 2019 a CERCICA na nossa “feira de Natal digital”, onde incentivamos os nossos colaboradores e seus familiares a adquirir produtos de instituições do Terceiro Setor. Desta forma conseguimos canalizar um financiamento que se pode revelar importante para organizações como a CERCICA, as quais, por seu turno, conseguem de forma ativa envolver os seus utentes na sustentabilidade da instituição. Parece-nos um circuito perfeito.
Nos tempos difíceis que vivemos todas as formas de apoio contam e são bem-vindas pelo Terceiro Setor. É neste sentido que apelo a que outras empresas portuguesas possam também ser um motor de dinamismo na resposta a esta “outra” emergência nacional e adotem iniciativas que envolvam as suas pessoas na resposta solidária tão necessária e imprescindível nesta altura.
Afonso Machado Arnaldo,
Partner e líder da área de Responsabilidade Social e Sustentabilidade da Delloitte